segunda-feira, 19 de abril de 2010

Conversas entre Basil Hallward, Lord Henry e Dorian Gray I


Presentes em "O Retrato de Dorian Gray" by Oscar Wilde



Basil:
"Tu não me compreendes, Harry.(...) Há uma fatalidade em toda a excelência física e intelectual, o tipo de fatalidade que tem perseguido ao longo da História os passos trôpegos dos reis. É melhor não sermos diferentes dos que nos rodeiam. Os feios e estúpidos são os que mais aproveitam do mundo. Podem sentar-se e olhar e bocejar à vontade. Se não têm qualquer noção do que seja a vitória, é-lhes pelo menos poupado o conhecimento da derrota. Vivem como todos nós devíamos viver, imperturbados, indiferentes e sem inquietações. Nunca causam a desgraça dos outros, nem sequer a recebem das mãos de outrem. O teu título e a tua fortuna, Harry; o meu cérebro, tal como é... a minha arte, o que quer que valha, a beleza do Dorian Gray... Havemos todos de sofrer por aquilo que nos concederam os deuses, de sofrer terrivelmente."

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Lord Henry: "Não existem boas influências, Mr. Gray. Todas as influências são imorais, imorais de um ponto de vista científico."

Dorian Gray: "Porquê?"

Lord Henry: "Porque influenciar uma pessoa é dar-lhe a nossa própria alma. O indivíduo deixa de pensar com os seus próprios pensamentos ou de arder com as suas próprias paixões. As suas virtudes não lhe são naturais. Os seus pecados, se é que existe tal coisa, são tomados de empréstimo. Torna-se o eco de uma música alheia, o actor de um papel que não foi escrito por ele. O objectivo da vida é o desenvolvimento próprio, a total percepção da própria natureza, é para isso que cada um de nós vem ao mundo. Hoje em dia, as pessoas têm medo de si próprias. Esqueceram o maior de todos os deveres, o dever para consigo próprias. É verdade que são caridosas. Alimentam os esfomeados e vestem os pobres. Mas as suas próprias almas morrem de fome e estão nuas. A coragem desapareceu da nossa raça e se calhar nunca a tivemos realmente. O temor à sociedade, que é a base da moral, e o temor a Deus, que é o segredo da religião, são as duas coisas que nos governam."

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Dorian Gray: "Julgas-me assim tão frívolo?"

Lord Henry: "Não, julgo-te assim tão profundo."

Dorian Gray: "Que queres dizer com isso?"

Lord Henry: "Meu caro rapaz, as pessoas realmente frívolas são as que só amam uma vez na vida. O que elas chamam lealdade ou fidelidade, chamo eu letargia do hábito ou falta de imaginação. A fidelidade representa na vida emocional o mesmo que a coerência na vida do intelecto, apenas uma confissão de impotência. A fidelidade! Tenho de a analisar um destes dias. Está intimamente associada à paixão da propriedade. Há muitas coisas que atiraríamos fora se não receássemos que outros as apanhassem. Mas não te quero interromper."

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Lord Henry: "Quando estamos apaixonados começamos sempre por ludibriar-nos e acabamos sempre ludibriando os outros. A isso chama o mundo um romance."

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Lord Henry: "As pessoas gostam muito de oferecer aquilo de que mais precisam. É o que eu chamo uma profunda generosidade."

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Pequena nota sobre as citações presentes no Happiness is a Knife, que provavelmente não irá interessar a ninguém, mas como rapaz obstinado e narcisista que sou, faço questão de partilhar:

Todas as citações colocadas neste blog têm o intuito de análise e reflexão por parte do leitor e não a ilustração de uma realidade absoluta. Eu mesmo posso não concordar com algumas delas. Mas o simples facto de possuírem ideologias bem denotadas e apelativas quer pela excelente construção sintáctica, quer pela beleza imagética criada, facilmente me conduzem por esse sinuoso e turbulento caminho que é o da formulação da opinião própria (mesmo sendo contrária). Espero que se deixem guiar também.

1 comentário:

  1. Ultimamente tenho pensado bastante no futuro. O eco de questões como estas ressoa, por vezes, de tal forma que se torna impossível a vivência numa realidade que não é minimamente controlada por nós mesmos. Penso logo existo, mas porquê?

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